Aqui bem perto de casa tem dois prédios residenciais para idosos. Embora nunca tenha entrada neles, sei que são equipados e especializados no trato da terceira idade que precisa de cuidados especiais. Um tipo de asilo urbano, um tanto quanto mais sofisticado.
Convivo diariamente com a rotina de ambulâncias, de enfermeiros e cuidadores subindo e descendo a rua em grupos na mudança dos turnos. Com alguns mais conhecidos troco cumprimentos, afagam nossas cachorras e trocam ideias superficiais, mas nunca falamos dos pacientes.
Observo que aos finais de semana e em alguns feriados o movimento de visitas por parte dos familiares aumenta, mas na grande maioria dos casos, o que vemos é tristeza no olhar daqueles “internos” que por vezes estão tomando um ar fresco naquela que parece ser a única área externa do prédio. Por mais bem estar que seja oferecido, para mim que sou leigo e que não precisei e espero não precisar fazer uso deste tipo de estabelecimento para nenhum ente da família, tem um ar de confinamento.
Converso semanalmente com 2 idosos que frequentemente estão na frente de um dos prédios pois o horário deles coincide com a caminhada que dou com as cachorras. Mesmo felizes com aquele papo frugal, aquele cumprimento rápido, percebo além da tristeza descrita acima, uma falta de perspectiva em ambos. A sensação que dá é que estão ali contando os dias e esperando a morte chegar. Justamente por isso é que procuro conversar um pouco e dar um mínimo de alento ou esperança a eles, se é que isso é possível.
Fico me perguntando o que se passa atrás daquelas paredes e confesso que sinto uma certa angústia pelos idosos.
Domingo 24/03 ao final do segundo e emocionante jogo da semifinal do campeonato Paulista de futebol sai para dar a tradicional volta do fim do dia com as cachorras. Estava feliz e de alma lavada pois o meu time que havia sido derrotado no dia anterior por um competente oponente cuja folha de pagamento inteira paga o salário de apenas 1 jogador do meu, vira seu arquirrival cair também, nos pênaltis, após eletrizantes minutos finais da partida em que tudo, simplesmente tudo poderia acontecer.
Estava lá andando e pensando no jogo quando comecei a ouvir gritos de um dos prédios dos idosos. Eram gritos de um senhor pedindo “pelo amor de Deus!”. Gritos que diferentemente das outras vezes não pararam de forma rápida. Me deu um mal-estar imediato e uma vontade de entrar para saber o que estava acontecendo. Tenho certeza de que lá trabalham pessoas competentes, treinadas e que o objetivo principal é gerar bem-estar e qualidade de vida aos idosos.
Não segui meus instintos, mas até o presente momento estou com um enorme desconforto.
Fazendo uma pequena analogia do conteúdo acima e trazendo isso á cena corporativa me veio em mente a recorrente ideia de que as empresas são feitas de pessoas. Todas elas têm seu ciclo dentro da corporação que muitas vezes se parece com o prédio dos idosos, bem equipado e com gestores tecnicamente qualificados e competentes, mas que nem sempre sabem cuidar do que é mais sagrado. As pessoas!
Outra semelhança está nos ditos “internos”, quantos colaboradores você conhece na sua ou em outras corporações que estão infelizes, tristes e que não se arriscam a uma mudança por comodidade, insegurança ou até mesmo por falta de opção?!
Quantos pedem por socorro, seja em forma de treinamento, capacitação, mais responsabilidade, mais engajamento, liberdade para agir, produzir e performar?..
Semelhanças entre os dois quadros tem demais, basta regular bem as lentes da verdade.
E você caro leitor, como esta você, feliz, ou acomodado por falta de opção esperando a morte chegar?!
Fica mais essa provocação e reflexão e nesse ínterim que tenhamos todos uma ótima semana.
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